segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Capítulo 20 - Sorriso de Julieta


O meu quarto está decorado em tons de branco e preto. A única cor existente é a do quadro gigante, com a imagem de um pôr-do-sol pintado pela minha irmã, que se encontra na parede do lado esquerdo onde está encostada a cama. Ao fundo da cama está a secretária com o computador e logo a seguir uma estante com dossiers e papeladas. A parede do lado direito do quarto está completa com o guarda-fatos de quatro portas de correr. No canto, um enorme espelho e uma mesa com a maquilhagem, perfumes e cremes. A janela fica na parede em frente à porta. Foi lá que o David se foi encostar.

- Tem uma linda vista daqui! – Senti-lhe um tom sensualmente provocador na voz.
- Pois tem. Alguma coisa que te seja familiar? – Perguntei-lhe no mesmo tom, mantendo-me no entanto de costas para ele.
- Sim… (sorriu) … aquela janela lá no fundo.
- Hum. No sétimo andar, a terceira a contar da direita?
- Isso mesmo. Sabe que lá também tem uma bela vista. Se vê algo que eu acho que também te é familiar.
- A sério? O quê? – O tom mantinha-se provocador e eu continuava de costas.
- No sétimo piso, a segundo janela a contar do lado esquerdo. A janela onde você se encosta todas as noites. Esta onde eu estou.

Sorri disfarçadamente. Abri a pasta das fotos, levantei-me, encostei a cadeira à parede por baixo da janela e puxei a secretária, virando-a no sentido do ponteiro dos relógios de forma a que ficasse de frente para a cama.

- O que é que tá fazendo?
- Então, não queres ver as fotos de pé, pois não? Assim sentamo-nos na cama e vemos perfeitamente. Porque é que achas que comprei uma secretária com rodinhas?
- Bem pensado.

Eu subi para cima da cama e sentei-me encostada à parede. O David sentou-se ao meu lado. Estávamos os dois descalços e de pernas cruzadas.

Fui-lhe mostrando as fotos e explicando a ordem pela qual estavam. “Desde o dia em que chegámos até ao dia que viemos embora”. Fui decifrando cada rua, cada lugar, cada festa, cada sorriso. Falava entusiasmada, recordando a cada nova imagem os cinco maravilhosos meses passados em Roma. E o David ouvia atento, de sorriso rasgado. Falei-lhe do imponente coliseu, da mística Praça de São Pedro, das pontes, dos monumentos e da Fontana di Trevi. “O mais belo lugar em Roma. À noite é ainda mais bonita. Dizem que quem atira uma moeda, volta lá de certeza. Eu atirei”. Eu não conseguia controlar as emoções. Sorri e chorei. Acabei por falar-lhe da minha avó e de como a morte dela, no dia de anos de Sílvia, quase me tinha feito desistir daquela aventura. Vi as lágrimas humedecerem-lhe os olhos, enquanto ele limpava as que me corriam pelas maçãs do rosto. Mudei de assunto. Falei-lhe nas viagens fantásticas que fizemos, eu e a Si: Florença, Nápoles, Veneza e Verona.

- Veneza deve ser linda! – Afirmou ainda com a voz embargada.
- Sim. Linda, romântica, diferente, especial. Vamos ver as fotos.

Abri a pasta de Veneza e mostrei-lhe o local que me tinha deixado completamente encantada. Os canais, as gôndolas, as máscaras. As ambulâncias, táxis e autocarros que, ali, afinal são barcos. As ruas estreitas e o cheiro nauseabundo das águas paradas que não tiram, no entanto, a beleza à cidade. A magnífica Praça de São Marcos. A chegada de comboio e a partida para Verona.

- A cidade de Romeu e Julieta? – Perguntou-me com um brilho nos olhos.
- Sim. Que vale só por isso. É uma cidade pequena, simples, mas que respira amor por todos os poros.
- Mostra.

Abri a pasta de Verona. E lá estávamos, eu e a Si, no túmulo da Julieta; na casa da Julieta; ao lado da estátua da Julieta; com a mão pousada na sua mama direita “que foi o que vimos os outros turistas fazerem por causa de um ditote qualquer”, explicava-lhe; na varanda da Julieta; a escrever uma mensagem de amor na parede da casa da Julieta.

- Volta atrás. – Pediu-me o David.

Olhei para ele intrigada mas respondi ao seu pedido. Voltei à foto em que eu estava debruçada na varanda da Julieta, de sorriso rasgado.

- Que foi David, há algum problema com a foto?
- Não, nenhum.
- Então?
- Está linda, simplesmente linda. – Dizia, fixando o seu olhar no meu.
- A foto? Mérito da Sílvia. – Respondi-lhe, sentindo as mãos já a tremerem.
- Você… está linda. Com um sorriso de Julieta. Uma pessoa se apaixona por esse seu sorriso apaixonado.

Eu tentei desviar o olhar mas não consegui evitar um sorriso. Procurei uma resposta que me permitisse a fuga àquele elogio sedutor.

- É impossível não nos sentirmos assim em Verona. O romantismo pairava no ar.
- Eu estava falando desse sorriso…

Enquanto acabava a frase, tocou-me levemente com o dedo indicador nos lábios. Um arrepio percorreu-me o corpo. Continuei a sorrir e com o olhar desviado. Procurava em qualquer ponto do meu quarto um abrigo para o medo. Para o medo que sentia do desejo, das sensações, dos sentimentos. Mas aquela procura foi interrompida pela mão quente do David a percorrer-me a cara. Prendeu-me o queixo, quase a suplicar-me que lhe olhasse nos olhos e eu não ofereci resistência. Olhámo-nos profundamente e deixámo-nos levar pelo desejo. Beijámo-nos… primeiro docemente, depois com uma intensidade que quase fazia estremecer o prédio. Era um beijo que de tão apaixonado exigia um maior contacto físico. Sucumbimos ao apelo dos nossos corpos. O David puxou-me contra ele e eu deixei-me ir. Tinha perdido completamente o controlo do meu corpo. Abracei-o com força e instintivamente deixámo-nos cair na cama. Entrelaçamos braços e pernas e alternámos pequenos beijos doces com um bailado de lábios e línguas que nos deixava ofegantes. Por breves momentos permitimos que as nossas mãos percorressem o corpo um do outro, mas no mesmo instante soubemos que não podíamos ir mais além. Era como se a consciência que tínhamos da nossa amizade nos colocasse uma barreira ao prazer.

Deixámo-nos ficar simplesmente abraçados na minha cama, contemplando as maravilhosas sombras provocadas pela luz do luar e das estrelas no tecto branco. Ficámos assim uns bons minutos, sem trocar uma única palavra. Até que o David se virou para mim e me deu um beijo na testa depois de me fazer uma festinha no nariz, que me souberam deliciosamente bem.

- Tenho de ir, deve ser tarde.

Esforcei o olhar e vi as horas no computador.

- Sim, é quase meia-noite.
- Então é melhor eu ir.

Levantámo-nos e saímos do quarto. O David foi à sala buscar as suas coisas e eu fiquei encostada à porta à sua espera. Ele voltou com um sorriso que me deixou completamente derretida. Abri-lhe a porta.

- Vai com cuidado.
- Eu moro pertinho, lagartixa, esqueceu?
- Mas mesmo assim.
- Não se preocupa. Faz boa viagem para Coimbra. Me liga quando chegar.
- Obrigada. Fica prometido.
- Então vou indo.
- Vai. Boa noite.
- Para você também.

Sorrimos de forma cúmplice e o David voltou a beijar-me e eu voltei a não oferecer resistência. Ele saiu e eu estava quase a fechar a porta, quando um impulso tomou conta de mim.

- David! – Chamei quase em sussurro.
- Oi.
- Promete-me que não marcas um golo no sábado.

O David soltou uma gargalhada genuína.

- Shiu, olha os vizinhos. – Disse-lhe, tentanto também eu controlar as minhas risadas.

O David levou os dedos à boca em forma de cruz.

- Lagartixa, eu prometo que não marco um golo…
- Obrigada.
- … Marco dois! – Voltou a soltar uma gargalhada.
- Shiiiuuu. És mesmo parvo, pá!

O David voltou a entrar, agarrou-me pela cintura e beijou-me intensamente. Antes de sair, ainda me sussurrou ao ouvido: “Olha que eu cumpro o que prometo”. Rimo-nos os dois baixinho. Eu empurrei-o para fora e ele começou a descer as escadas. Eu fechei a porta e deixei-me deslizar. Fiquei ali sentada por breves momentos. Depois, como que se um clique me tivesse despertado para a realidade levantei-me, fui à cozinha fumar um cigarro. Podia ver o carro do David a afastar-se.

“No que é que tu te estás a meter Kika? A brincadeira ainda vai acabar mal, ai vai vai. Acorda, Kika, acorda! A tua realidade não é esta”. Fumei o cigarro todo com a minha consciência a atormentar-me, o que me estava a deixar ligeiramente irritada. “Oh fodasse, isto só pode ser sono”. Apaguei o cigarro, bebi um copo de leite, fui à casa de banho escovar os dentes e voltei ao quarto… desta vez sozinha.

7 comentários:

  1. Fodasseeeee Ana sozinha? ahahah
    Mais uma vez adorei :D

    Beijinhos e Obrigada mais uma vez ^^

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  2. já te disse hoje que te odeio?!lol...
    bjocas

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  3. Melhor que chegar a segunda-feira e ter um capitulo novinho em folha para ler... é ter dois capitulos lindos e apaixonantes.
    Ai como eu gosto da paixão entre estes dois.

    Um dia tambem tenho de visitar Italia, tudo o que já tive a oportunidade de ver é encantador que só apetece apanhar o avião e ir correr para lá

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  4. Oh Ana, como eu amo a tua fic (:
    está mesmo perfeita!

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  5. muito giro sigam a minha fanfic
    www.odestino23.blogspot.com

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  6. Que queridos ohh *.*
    Amei!

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  7. Espero bem que no dia de anos da tua irmã, lhe leves uma camisola do davidji luiz pow, ou entao a leves num fim de semana la a casa, para passear com voces, ahahah.

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